Sunday, November 23, 2008

Fragmentos de emoção

Como diria a sabedoria popular, fundo de poço tem mola. Ao atingir o ponto máximo da tristeza, sentir rondar a depressão e estar prestes a largar os bets, automaticamente uma força surge dentro de nós e nos impulsiona a virar o jogo, retomar a rota positiva da energia e, aos pouquinhos, superar aquilo que nos fez sofrer.
O sofrimento em si, entretanto, é extremamente válido. É ele que transpassa nossa carne e expõe nossas entranhas, colocando-nos em contato com nosso lado mais íntimo, revelando nossa fraqueza e confrontando nossa identidade. E é em meio à essa estranha beleza do sofrimento que achamos o caminho para renascer.
Como bem disse Rubem Alves, ostra feliz não produz pérola. É tentando se defender da dor e do sofrimento causado por um grão de areia infiltrado dentro de si, que a ostra começa a encobri-lo com uma superfície lisa e polida, gerando uma das mais belas e perfeitas obras de arte da natureza. Da mesma maneira, o sofrimento, apesar de não desejado, se infiltra através de nossas barreiras, quebra nossas defesas, nos deixa vulneráveis, e fica lá, nos incomodando e demandando ação, até resolvermos lidar com ele e transformá-lo em obra de arte.
O ato de sofrer exacerba nossa sensibilidade. Pessoas naturalmente mais sensíveis tendem a sofrer mais, no processo de formação de suas pérolas. Nietsche, por exemplo, tinha dores de cabeça terríveis durante a produção de seus livros, coroando o final de longos processos de auto-questionamento. Eu, pequena que sou, também tive meu grau particular de exacerbação do sofrimento. Aprendi que é importante se dar ao direito de curtir os momentos de dor. Toda perda, por menor que seja, traz consigo o aprendizado do luto, que deve ser vivido fase a fase.
Depois que passa o sofrimento - já que, por mais que demore, um dia a pérola fica pronta! - os motivos que o causaram ficam distantes, desfocados, quase imperceptíveis. Para mim, não ficou guardado nenhum tipo de rancor quanto à natureza do sofrimento ou à quem de alguma maneira tenha participado dele. Mas todos os momentos de retração e de introspecção causados pela dor, esses sim, deixaram suas marcas. Eles prepararam o terreno para que as felicidades que o estão sucedendo sejam mais fortes, mais duradouras, já que partem de uma base limpa e sólida.
Para se lidar bem com as emoções, talvez há de se ser assim, meio poeta.

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P.S. Assim como para a Rê, para mim também voar de avião é inspirador...este texto foi escrito mentalmente no trecho São Paulo - Curitiba deste final de semana. E, assim como a Rê, tive a prudência de esperar desembarcar para publicá-lo...rs...

2 comments:

gabi said...

Se o avião é inspirador, então terei um texto bastante longo e denso para publicar assim que chegar do outro lado do mundo. Palco da nova fase da minha vida... e vcs (re e ju) podem ter certeza de que farão parte do texto e da nova fase da minha vida.
Vcs foram "in-dispenáveis" nos momentos difíceis do ano e também nos momentos comemorativos.
Amigas especiais podem ser a obra de arte que surgem em momentos não tão agradáveis... as pérolas que tiramos dos sofrimentos, já que são importantes para superação e crescimento...
Sentirei saudades!

Beijinhos

Anonymous said...

Meu avô, meu heroi, era piloto e de alguma forma ele sempre disse que quando voava alcançava as estrelas. Talvez o avião traga um pouco disso... uma visão sobre as nuvens, mais perto das estrelas. Tivemos algumas nuvens bem pesadas sobrevoando por ai esse ano, mas "cada um quase na sua" conseguiu alcançar aquela estrela... Vocês foram minhas asas! Agora é só voarmos juntas até na Nova Zelandia na casa da Gabi´s!!! Beijos